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Dormir no Deserto: É Confortável ou Só Bonito nas Fotos?

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    Entre dunas douradas, pores do sol em tons alaranjados e céus estrelados que parecem pintados à mão, dormir no deserto virou sinônimo de experiência transformadora — e, claro, conteúdo irresistível para as redes sociais. Mas será que essa vivência toda é tão mágica quanto parece nos carrosséis do Instagram? Ou estamos nos apaixonando por um cenário que esconde bastidores bem menos glamurosos?

    Neste artigo, vamos explorar o que realmente significa passar uma noite no meio do nada — e por que essa escolha pode ser tão desafiadora quanto inesquecível. Vamos passear por destinos como o deserto do Saara, no Marrocos, e Wadi Rum, na Jordânia, para entender o que há por trás das tendas luxuosas, dos tapetes orientais e das luzes de velas. Afinal, viajar é também sobre lidar com o inesperado — e o deserto é mestre nisso.

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    O fascínio do vazio: por que tanta gente quer dormir no deserto?

    O deserto exerce um magnetismo difícil de explicar. Ele não é apenas paisagem, é estado de espírito. A imensidão silenciosa, a sensação de isolamento total, o horizonte que parece não ter fim — tudo isso cria uma atmosfera quase espiritual. Para quem vive em cidades cheias, barulhentas e hiperconectadas, o deserto oferece o oposto: silêncio, vastidão e tempo desacelerado.

    Além disso, há o apelo visual. O deserto é fotogênico por natureza. As cores mudam ao longo do dia, a luz brinca com as formas, e qualquer objeto — uma tenda, uma xícara de chá, uma almofada colorida — vira parte de uma cena cinematográfica. As imagens vendem bem. E não é à toa que agências de turismo e hotéis capricham na estética: o visual vende uma ideia de paz, aventura e exclusividade.

    Mas o que as fotos não mostram — e poucos comentam — é o que está por trás dessas experiências.


    O frio que ninguém posta: as noites no deserto são geladas

    Uma das primeiras surpresas de quem resolve dormir no deserto é a temperatura. Durante o dia, o calor pode beirar os 40 °C, mas quando o sol se põe, a sensação térmica despenca. Em Wadi Rum, por exemplo, as noites de inverno chegam facilmente a 0 °C. E não é raro acordar tremendo, mesmo dentro de tendas supostamente preparadas.

    Claro, os acampamentos estão se adaptando. Muitos oferecem tendas com calefação, cobertores pesados e até ar-condicionado (sim, no deserto!). Mas essas comodidades geralmente estão nos chamados “glampings”, versões de luxo do acampamento tradicional. E é importante dizer: quanto mais rústico o lugar, mais real a experiência — mas também mais desafiadora.


    Banheiro, chuveiro e outras questões práticas que ninguém menciona

    Um dos pontos menos abordados nas redes é o conforto estrutural. Em muitos acampamentos, o banheiro é coletivo — ou sequer existe, sendo substituído por soluções improvisadas em meio às dunas. E o banho quente? Nem sempre é garantido. Em regiões remotas, a água é um recurso limitado, e o luxo do chuveiro quente pode ser substituído por lenços umedecidos ou uma bacia d’água.

    Por isso, vale a reflexão: o que você espera dessa viagem? Se busca uma imersão profunda, autêntica e minimalista, os acampamentos simples podem ser ideais. Mas se conforto é prioridade, talvez o glamping seja a melhor escolha. O segredo está em alinhar expectativa e realidade — e lembrar que nem todo perrengue é fotogênico.


    Wadi Rum: dormir onde o solo parece Marte

    Chamado de “Vale da Lua”, Wadi Rum, na Jordânia, é um dos destinos favoritos de quem quer uma experiência marcante no deserto. O lugar já foi cenário de filmes como Perdido em Marte, Aladdin e Lawrence da Arábia, e não à toa: sua paisagem avermelhada e rochosa realmente parece de outro planeta.

    A maioria dos acampamentos por lá é gerida por beduínos, que misturam tradições locais com o apelo turístico. É comum ter jantares ao redor da fogueira, ouvir músicas típicas e comer pratos preparados em buracos na areia — um método ancestral chamado Zarb. Dormir em tendas transparentes, com teto de vidro para observar as estrelas, virou moda nos últimos anos.

    Mas, de novo: nem tudo são flores. A conexão de internet costuma ser fraca ou inexistente, a poeira entra em tudo, e o isolamento exige disposição emocional. É lindo, sim. Mas também é intenso.


    Saara: o deserto mais famoso do mundo e suas várias versões

    O Saara é gigantesco, atravessa mais de 10 países e oferece experiências muito diferentes dependendo da região. No Marrocos, por exemplo, a cidade de Merzouga é a porta de entrada para o Erg Chebbi, um mar de dunas que parece saído de um sonho.

    Lá, os acampamentos vão do super básico ao ultraluxuoso. Alguns oferecem piscinas no meio do deserto (!), jantar com pratos gourmet e camas dignas de hotel cinco estrelas. Outros são mais simples, com tendas de tecido e colchões no chão.

    Mas mesmo nos acampamentos mais sofisticados, é impossível fugir da areia. Ela está em tudo: no sapato, no cabelo, na escova de dentes. E o vento? Quando resolve aparecer, transforma o clima de tranquilidade em um mini caos. É a natureza lembrando que ela está no comando.


    O que torna tudo inesquecível (mesmo com os perrengues)

    Apesar de todos os desafios, há algo quase mágico em dormir no deserto. Talvez seja o céu, que revela mais estrelas do que nossos olhos estão acostumados. Ou o silêncio absoluto, que nos faz ouvir a própria respiração. Ou ainda o nascer do sol, que pinta as dunas com tons dourados e nos dá a sensação de estar assistindo a um espetáculo particular.

    A desconexão total (literal e figurada) também contribui. Sem sinal de celular, sem notificações, sem distrações. A mente desacelera, o tempo ganha outro ritmo, e a presença se torna mais intensa. Muitos viajantes relatam que foi no deserto que conseguiram meditar pela primeira vez, ou que sentiram uma paz que não sabiam existir.

    E talvez seja isso que faz a experiência valer a pena. Mesmo com o frio, o vento, a poeira e o banheiro improvisado.


    Instagram x Realidade: como equilibrar expectativa e experiência

    É impossível ignorar o papel das redes sociais na popularização dessas experiências. Ver influenciadores posando com vestidos longos em cima de camelos, ou tomando café da manhã na areia com o sol nascendo ao fundo, cria um imaginário irresistível.

    Mas é preciso lembrar que fotos são recortes. Muitas vezes, por trás daquela imagem poética, há horas de espera pela luz perfeita, ou uma produção toda para “esconder” a bagunça real. Isso não invalida a beleza da experiência — só reforça a importância de não romantizá-la demais.

    Se você for com o coração aberto e a mala com camadas suficientes de roupa (e tolerância a eventuais imprevistos), o deserto pode, sim, te surpreender positivamente.


    Vale a pena?

    A resposta curta: sim.
    A resposta longa: depende do que você busca.

    Dormir no deserto é uma daquelas experiências que não dá para descrever completamente — só vivendo. Ela pode ser desconfortável em alguns momentos, sim. Pode exigir paciência, adaptação e até uma certa dose de desapego. Mas também oferece momentos de beleza bruta, silêncio curador e conexão com algo maior.

    Se você está disposta(o) a aceitar o pacote completo — o belo e o difícil —, então vale cada segundo. E cada grão de areia no tênis.


    Dica final de quem já foi e voltaria: leve um bom casaco, protetor solar, lanterna, uma mente curiosa… e o coração leve. O deserto não é só bonito nas fotos — ele é bonito porque, de um jeito simples e direto, nos lembra do que realmente importa.